01/11/2024
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Claudionor Marcelino

CLAUDIONOR MARCELINO

Artista, genial, mágico…esses são alguns adjetivos que fazem parte do vocabulário dos amigos quando pedimos para comentar sobre Claudionor Marcelino dos Santos. A Praça XI foi seu palco principal e até hoje, época do imponente sambódromo, ainda não apareceu quem rivalizasse com ele na arte de sambar.

Claudionor foi portelense dos primeiros anos, um de nossos principais fundadores. Nunca deixava de desfilar pela sua querida Portela, e para isso enfrentava todas as adversidades que fosse preciso, pois sua escola de coração estava sempre em primeiro lugar.

Seu nome será sempre lembrado no hall dos grandes portelenses, eternizado por Monarco em seu famoso samba “Passado de Glória”:


“Paulo e Claudionor quando chegava

na roda de samba abafava

todos corriam pra ver”.

Conheça um pouco desse artista tão importante para a Portela e para o carnaval carioca, mas esquecido e ignorado pelas novas gerações.

 

O fundador

Claudionor, assim como Paulo, Caetano e Rufino, fez parte do antigo bloco “Baianinhas de Oswaldo Cruz”. Era irmão de Galdino dos Santos, líder do grupo e responsável pelo desentendimento que motivou o afastamento de alguns membros, resultando na fundação do “Conjunto Carnavalesco de Oswaldo Cruz”, primeiro nome da nossa Portela. Claudionor acompanhou seus amigos e se tornou um dos principais membros do novo bloco. Mais tarde, solucionados os problemas que motivaram o desentendimento, o próprio Galdino passou a fazer parte do novo grupo, e a família pôde se reunir novamente.

Antônio Caetano, amigo pessoal que o chamava de “rei do sapateado”, sempre destacou a importância de Claudionor para o sucesso da Portela em seus primeiros anos.

 

O Passsista da Praça XI

Quando começaram as primeiras disputas na antiga Praça XI, Claudionor passou a ser reconhecido e respeitado. Todos comentavam sobre os belos espetáculos do famoso passista da então “Vai Como Pode”. A cada ano que passava seu prestígio aumentava. Era uma das figuras mais aguardadas da Portela. Se os famosos compositores garantiam o sucesso dos sambas da escola, Claudionor era o principal responsável pelos espetáculos, pela arte do samba no pé, pelos aplausos que a escola recebia.

Claudionor foi o rei da Praça XI. Mesmo no início da década de 40, quando a praça começou a ser destruída para dar passagem à avenida Presidente Vargas, Claudionor dava seu show em meio aos escombros da antiga meca dos sambistas.

Em 1940, sua fama era tanta que foi convidado para integrar o “Sodade do Cordão”, grupo carnavalesco idealizado pelo maestro Heitor Villa-Lobos que, com a pretensão de reviver os antigos carnavais, contava com a presença, além de Claudionor, de nomes como Zé Espinguela, Antenor, Ventura, Delfino e Euzébio Coelho. Não foi à toa que essa iniciativa entrou para a história do carnaval carioca.

 

O Serrano portelense

Claudionor sempre amou a escola que ajudou a criar, cultivando até o fim sua amizade com a turma de Oswaldo Cruz. Mas Claudionor sempre aprontou das suas. Aprontou tanto que, por castigo, certa vez Paulo não quis pagar a roupa para que o passista pudesse desfilar.

Como sempre foi muito esbanjador, o passista nunca tinha dinheiro para mandar fazer sua indumentária. Como sua presença era garantia de espetáculo e lucro para a escola, Paulo sempre arrumava um jeito de colocar o artista no desfile. Mas um dia resolveu castigá-lo, apesar da grande amizade que os unia. Esperto, Claudionor foi até o Prazer da Serrinha, embrião do atual Império Serrano, e se ofereceu para desfilar trajando cores neutras. Animados com a chance de ter o maior passista do carnaval carioca em sua escola, os serranos pagaram a fantasia para Claudionor. Porém, quando sua Portela entrou na avenida, o rei da Praça XI não pensou duas vezes: entrou junto e, deixando o coração falar mais alto, seguiu com a sua escola.

O que aconteceu depois é contraditório: para o pessoal da Serrinha, Claudionor acabou sendo perdoado; para os portelenses, apanhou tanto que desceu as escadarias do Morro da Serrinha rolando.

 

A “Morte da baiana”

Os casos amorosos de Claudionor eram conhecidos por todos. Estava sempre buscando novas companheiras e aventuras. Certa vez, começou um relacionamento com Juracy, baiana do Prazer da Serrinha. Apesar dos avisos dos amigos, Juracy se apaixonou completamente pelo passista.

Um dia, Claudionor, como era de costume, partiu para uma nova aventura. Desesperada, Juracy ateou fogo ao próprio corpo. Seu falecimento foi um drama para a comunidade da Serrinha, e muitos acreditaram que a escola não iria desfilar, até que Delfino, compositor oficial da escola e pai de Juracy, tirou de sua dor o enredo que a escola apresentaria: “A morte da baiana”.

As aventuras amorosas do rei dos passistas motivaram um samba do amigo Herivelto Martins:

“Por que será que em toda história

Sempre existe uma mulher

Por que será? Não és capaz de responder

Fala, Claudionor

Chora no meu ombro a tua dor”.

Apenas com a idade avançada, Claudionor resolveu se casar e ter filhos.

 

O melhor passista de todos os tempos

Se os passistas são aqueles que transmitem o ritmo do samba através da ginga do corpo, Claudionor Marcelino dos Santos foi quem melhor expressou a “dança do samba”. O bom passista é aquele que transmite o ritmo através da intuição, tudo é criação, nada é ensaiado ou coreografado.

Apesar dos anos, Claudionor é reconhecido como o melhor passista que já pisou as diversas passarelas por onde as escolas desfilaram ao longo dos carnavais. Claudionor brincava de dançar e tinha prazer em sambar. Imitava, no ritmo do samba, os passos que o ator Charlie Chaplin eternizou no cinema com seu personagem Carlitos, e por isso seu prestígio ultrapassou a fronteira do tempo, momentos românticos da Praça XI que fazem parte de nossa história. História não só de nossa Portela, mas de nosso carnaval, de nossa cultura.

Infelizmente, não existem imagens dos espetáculos de Claudionor. Pouca gente que presenciou o “rei do sapateado” em ação permanece vivo, mas e daí? Seu legado está presente até hoje para quem freqüenta o Portelão.

 

O legado de Claudionor

As pessoas que costumam freqüentar todas as quadras do Rio de Janeiro sabem que o Portelão possuiu uma peculiaridade que o difere das demais. Na quadra da Portela existe samba de verdade.

Lá é possível encontrar grandes passistas, rodas feitas por artistas que sabem, como poucos, expressar o ritmo do samba através do corpo. Essas rodas de passistas já desapareceram de grande parte de nossas quadras, mas sobrevivem como uma das características fundamentais dos ensaios da Portela.

A Portela sempre foi sinônimo de grandes sambistas, e tudo isso começou a partir de Claudionor, nosso primeiro grande passista, mestre que exerceu influência direta sobre seus seguidores. Com Claudionor, estava inaugurada a tradição portelense de grandes mestres da arte de sambar.

Claudionor morreu, mas seu legado se mantém vivo. É passado de geração para geração, e hoje está presente nas rodas de samba do Portelão. Claudionor vive no gingado de cada passista da Portela, pois, mesmo que eles não saibam, a “dança do samba” em Oswaldo Cruz foi inaugurada com Claudionor e seus ensinamentos transmitidos naturalmente até nossos dias.

Depois do mestre, Tijolo, Celsinho, Bambolê, Mauricinho, Jorginho, Joãozinho e Gerônimo foram outros grandes passistas masculinos que herdaram a arte do “rei do sapateado”, criando ramificações que foram se alastrando e resultaram na infinidade de passistas gabaritados que a Portela possui hoje, uma interminável árvore que continua a crescer. E nessa árvore de grandes passistas, cujos frutos são colhidos em nossa quadra, a raiz se encontra nos primeiros passos de Claudionor Marcelino dos Santos, o maior passista de todos os tempos.

 

Pesquisa e criação de texto: Fábio Pavão

Bibliografia:

CABRAL, Sérgio. As escolas de samba do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, Ed. Lumiar, 1996.

CANDEIA FILHO, Antônio & ARAÚJO, Isnard. Escola de samba – árvore que esqueceu a raiz. Rio de Janeiro, Ed. Lidador, 1978.

JÓRIO, Amaury & ARAÚJO, Hiran. Escolas de samba em desfile – vida, paixão e sorte. Rio de Janeiro, Poligráfica ed., 1969.

SILVA, Marília T. Barboza & SANTOS, Lygia. Paulo da Portela – traço de união entre duas culturas. Rio de Janeiro, Funarte, 1979.

____ & Arthur L. de Oliveira Filho. Silas de Oliveira – Do jongo ao samba enredo. Rio de Janeiro, Funarte, 1981.

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