29/04/2024
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Carlinhos Catanha

Mestre Carlinhos Catanha

2003

Mestre Carlinhos Catanha não chegou a dirigir a bateria de Portela em 2004. Um desentendimento com a diretoria o afastou do cargo. Mas em 2003, durante os preparativos, ele concedeu a seguinte entrevista para a PortelaWeb.

Mestre Carlinhos Catanha tem 33 anos de idade. Nasceu em Bento Ribeiro e entrou na Portela em 1981. Em 1985, começou a fazer parte da bateria da Escola. Em 2003, assumiu o posto de Mestre. Catanha é um dos maiores defensores das características da bateria da Portela. Quer montar uma escolinha para que a batida da escola seja resgatada e preservada. Neste momento, Carlinhos Catanha prepara a “Tabajara do Samba” – como é conhecida a bateria de Osvaldo Cruz – para passar bem cadenciada na avenida no desfile de 2004. E confessa: “Eu amo a Portela, amo o que faço”.

Portelaweb: Por que Carlinhos Catanha?

Catanha: Meu nome verdadeiro é Carlos Roberto Alves de Araújo. O Catanha é por causa do meu pai, que é conhecido no mundo do samba com esse nome.

Portelaweb: Mas tem algum significado?

Catanha: Tem (risos). É que meu pai jogava muita bola e, uma vez, o time ficou concentrado num lugar onde havia muito pé de castanha. Papai ficava lá comendo e aí o pessoal do time colocou o apelido nele de “Castanha”. Daí mudou para “Catanha” e eu acabei pegando esse apelido também.

Portelaweb: Como chegou à Portela?

Catanha: Meu pai ia para o ensaio da Portela e eu ia atrás. Sempre gostei de tocar tamborim. Saí na Ala das Crianças de 81 a 84. Um certo domingo teve um ensaio de rua e, no final, eu fui para o palanque da bateria. Fiquei lá tocando tamborim. O Marçal me viu e falou para meu pai que eu tocava muito bem e que não devia estar na Ala das Crianças. Mandou meu pai me trazer para a bateria. Em 1985, com 14 pra 15 anos, eu saí pela primeira vez na bateria da Portela, onde estou até hoje.

Portelaweb: Qual a característica da bateria da Portela?

Catanha: É uma bateria conhecida pelas marcações. Uma das baterias mais pesadas que existem no carnaval carioca e paulista. Sempre foi assim. Nossa armação na avenida é diferente de todas as outras baterias. Nossos surdos de primeira ficam em linha no lado direito da bateria; os surdos de segunda, no lado esquerdo. Esse alinhamento é da Portela, não fui eu que inventei. Além disso, nossos surdos de terceira têm uma batida tradicional. Todo mundo na bateria sabe.

Portelaweb: E manter essa característica é importante?

Catanha: A bateria da Portela é cadenciada, toca cadenciada. E eu gosto disso. Gosto das coisas antigas. Não vai ser o Carlinhos Catanha que vai mudar as tradições da bateria da Portela. Este ano (2003), muita gente falou que eu tinha mudado a bateria da escola. Na verdade eu não mudei. O que acontece é que cada samba é uma história diferente, cada samba tem um arranjo diferente. E a gente tinha que fazer a bateria tocar da melhor forma aquele samba.

Portelaweb: E do que foi que as pessoas não gostaram?

Catanha: Foram as paradinhas. Nós fizemos duas paradinhas porque o samba pedia a paradinha. Uma delas entrou na parte que cantava “Somos o cais, emblema da paz” e a outra no refrão. Mas eu não fui o primeiro a fazer paradinha na bateria da Portela. Nós temos feito paradinhas desde 1995.

Portelaweb: E na Portela tem que ter paradinha ou não?

Catanha: Depende. Eu defendo o que a Comissão de Carnaval fala. Se eles falarem que pode fazer porque não vai prejudicar a harmonia da escola, eu faço.

Portelaweb: E o samba-enredo de 2004, que é o samba de 1970, vai ter a mesma cadência que tinha há 33 anos?

Catanha: Sim. O arranjo, a harmonia e o tom do samba serão os mesmos de 1970.

Portelaweb: E os preparativos?

Catanha: Já estamos envolvidos com isso. Vamos trabalhar o arranjo do samba, ver o andamento junto com o Gera, nosso puxador, com um cavaco e com a Direção de Harmonia da escola. Vamos botar um grupo de 40 ritmistas para fazer o arranjo do samba. Mas vai ser tranqüilo.

Portelaweb: Então, para o desfile de 2004, não vamos ter surpresas?

Catanha: Acho que não.  Mesmo assim vai ser muita responsabilidade tocar esse samba, porque é um samba que fez história. É um samba campeão. A escola venceu o carnaval de 1970 com esse samba. Na hora, o coração portelense vai bater forte (risos).

Portelaweb: E a fantasia da bateria?

Catanha: Tá linda, linda. Tem uns detalhezinhos para ver ainda, mas vai dar para bater bem. Eu estou dando umas opiniões no que pode atrapalhar o ritmista. Mas não vai tirar nem a beleza nem o brilho dela. O mestre de bateria tem que ver isso, porque se der algum problema na hora por causa da fantasia, quem vai ser cobrado somos nós, vou ser eu. Se eu dependo do ritmista para ele evoluir no desfile, como é que eu vou exigir isso se a fantasia atrapalhar? Não dá. A roupa tem que estar adequada.

Portelaweb: Nós ouvimos falar que o Mestre Catanha pretende montar uma escolinha de ritmistas na Portela. É verdade?

Catanha: Ih rapaz… isso é meu sonho. E já tem gente me perguntando sobre isso. A escolinha teria como objetivo ensinar crianças, jovens e adultos a tocar a batida tradicional da escola. Eu quero resgatar a antiga batida de caixa da Portela. Quero que todas as caixas venham fazendo o que as caixas da Portela sempre fizeram. Quero que venham rufando. A gente não pode deixar essa batida de caixa desaparecer. Tem gente que ainda toca assim, mas é muita pouca gente. A escolinha atenderia os bairros de Bento Ribeiro, Madureira, Osvaldo Cruz, Rocha Miranda e adjacências. Eu vejo criança no ensaio do lado da gente, pedindo para aprender. Seria tão bom se acontecesse! Nós já estamos conversando com nosso presidente para começar esse trabalho. Seria um grande projeto para a Portela e para o samba.

Portelaweb: E está faltando o quê?

Catanha: Está faltando patrocínio. Mas com certeza vai sair. Aliás, eu já tenho o patrocínio, mas faltam só duas assinaturas para dar a quantia que a gente precisa para começar.

Portelaweb: E o futuro, Mestre Catanha? Quer seguir à frente da bateria da Portela?

Catanha: Isso é a Diretoria quem decide. Se depender de mim, estando como mestre ou não, eu sou Portela. Não importa. Eu amo a Portela, amo o que faço. Estar dentro da bateria da minha Portela é tudo o que gosto. Eu vivo a Portela dia a dia. Fico sempre vendo o que está faltando, onde posso melhorar. Gosto da coisa. Nasci aqui e não vou fugir.

Entrevista: Marcello Sudoh

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