15/05/2024
EntrevistasMemória

Cristina Buarque

Cristina Buarque

O dia que conheci um baobá (por Luis Carlos Magalhães)

Quase todo mundo leu O Pequeno Príncipe e sabe o que é um Baobá. Eu li mas, confesso, não fazia idéia de seu tamanho…de tanta majestade.

Foi lá em Paquetá, no dia em que Vanderson, Almir e eu fomos visitar Cristina Buarque.

Encontrar um quanto o outro é muito fácil. Qualquer morador sabe.

Inteligente, absolutamente simples e despojada, bemhumoradíssima e consciente do papel que exerce com sua arte.

Conversar com Cristina mais fácil ainda, só dizer que a conversa é sobre a Portela e, sobretudo, sobre os compositores que fizeram sua história.

Foi assim que fizemos em uma manhã de sábado em sua acolhedora casa , em meio a tantos gatos, plantas e cervejas.

Queríamos ali saber dela, quem era ela afinal, de onde teria saído tão grande paixão pela Portela, tão pequena paixão pelos desfiles. Saber, enfim, que Portela é essa tão forte dentro dela.

Paixão tardia, madura, não planejada. Sólida como aquele Baobá ali perto, tão forte, tão imenso.

Majestoso como nossa querida Portela.

 Luis Carlos Magalhães

 Luiz Carlos Magalhães: Nós estamos com uma curiosidade: por que morar em Paquetá? É um autoexílio? Está difícil viver na cidade?

Cristina Buarque:  É praticamente isso. Não sei se vocês repararam, mas na entrada da casa tem uma placa que um amigo fez, que diz: “Eu fui porque não tive paciência”, de um samba do Roberto Martins. O Rio estava ficando muito chato. Muitas pessoas na rua. Você vai a um bar, todo mundo falando muito, não se consegue ouvir direito o que está tocando. As pessoas também estão muito nervosas. Eu praticamente não saía mais de casa. E estava querendo um pouco de sossego. Aqui você sai de madrugada andando na rua, conversando com as pessoas, tudo na maior tranquilidade. E é pouca gente. Todo mundo se conhece. Todo mundo é amigo de todo mundo. Todas as classes misturadas. Vim pela tranquilidade mesmo.

LCM: Eu fico imaginando: será que Cristina foi para Paquetá para fumar e beber sua cerveja em paz?

CB: Eu vim pra cá antes dessa lei antitabagismo. Mas realmente está difícil. Toda vez que vou a algum restaurante no Rio, vou embora correndo.

PortelaWeb: Há quanto tempo você está em Paquetá?

CB: Dois anos. Eu vim em novembro de 2008. Mas eu já estava querendo vir há 10 anos

LCM: Aqui tem uma tradição cultural que tem a ver com você. Um movimento de choro. Fale um pouco sobre isso.

CB: Todo último domingo do mês tem a Barca do Choro. Uma maravilha. Eles vêm tocando e vão lá para a Casa de Artes. Tocam nos jardins da Casa. Quem organiza é o Pedro Amorim, que está morando em Paquetá também. Ele traz o pessoal da Escola Portátil de Música. Paquetá tem uma tradição legal. O Anacleto nasceu aqui. Orestes Barbosa morou aqui também. Silvio Caldas vinha muito pra cá. Roberto Martins. O Wilson Batista casou e comprou uma casa aqui. Quatro anos depois a mulher o despachou, porque ele não voltava nunca (rs). Dizem que o Pixinguinha e o Jacó vinham muito.

LCM: Era uma tradição dos sambistas fazer piquenique.

CB: O pessoal da Portela vinha também. Tem o registro de um desfile aqui na Ilha. Toda terça-feira a gente organiza um cineclube, com uma televisão velha, no bar do Paulão 7 Copos (rs). Nós assistimos a esse filme, que mostra o desfile. Acho que é o filme da Velha Guarda.

LCM: Quando você diz “a gente”, quem é esse pessoal?

CB: A turma que frequenta o bar. Nós organizamos uma confraria, que junta dinheiro para fazer alguma coisa aqui todo mês.

LCM: Esses eventos têm a ver com aquele convite que a Régia manda?

CB: Não. A Régia e o pessoal da Portela costumam vir todo terceiro domingo do mês. Fazem o samba aqui na rua mesmo.

LCM: Pelo visto a vida por aqui é bastante animada.

CB: Eu já disse que estou pensando em morar na Voluntários da Pátria, no primeiro andar de frente (rs). Quando não estou fazendo nada, aparece alguém chamando para tomar uma cerveja. É muita gente legal.

LCM: Cristina, outra curiosidade: quem foi o incompetente da família? Você, que não conseguiu convencer seu irmão a ser portelense, ou ele, que não a convenceu a ser mangueirense?

CB: Eu tenho uma teoria que no fundo todo mangueirense é portelense. Na verdade eu não era portelense. Quando nós morávamos em São Paulo, não tinha muito essa coisa. Foi depois do disco que o Paulinho da Viola fez com a Velha Guarda da Portela, em 1970, que eu vi que tinha tanta gente boa, tanto compositor que eu não tinha ouvido falar, que surgiu essa paixão pela Portela. Eu virei portelense por causa da Velha Guarda. A minha relação com a Portela é por causa dos compositores. O Chico eu não sei. Acho que a Mangueira chamou-o para fazer alguma coisa e aí ele virou mangueirense (rs).

PW: Fala um pouco mais sobre essa teoria de que todo mangueirense é no fundo um pouco portelense.

CB: Eu comecei a observar alguns mangueirenses. O Paulo César Pinheiro é um que diz que é mangueirense, mas quem faz “Portela na Avenida”… Uma vez eu fui ao antigo People, com alguns amigos do Bip Bip, assistir a um show da Beth Carvalho. E no grupo tinha um que era muito mangueirense. Ela começou a cantar sambas da Portela e não parava mais. E aí ele gritava: “Canta um samba da Mangueira pelo amor de Deus (rs)!” Tem a história do Paulo da Portela que foi morar na Mangueira. Na verdade é uma brincadeira, eu aproveitava esses casos, para brincar dizendo que todo mangueirense é no fundo portelense.

LCM: No dia do enterro do Xangô, Marquinhos de Oswaldo Cruz falou para Chininha, então presidente da Mangueira: “É, Chininha, mais um portelense que morreu”.

CB: A Clementina de Jesus também.

LCM: É verdade. Tem uma entrevista dela feita pelo Sérgio Cabral, onde ela diz que era portelense. Virou mangueirense por causa do marido.

LCM: No primeiro disco da Velha Guarda você não teve nenhuma participação?

CB: Nenhuma. Eu não conhecia nada. Quando eu gravei “Quantas Lágrimas”, não conhecia Manacéia. Não fui eu que escolhi a música. Eu falei para o produtor do meu disco que queria gravar alguma música do disco da Velha Guarda, qualquer uma, pois todas eram maravilhosas. Foi ele que escolheu “Quantas Lágrimas”. Eu gostava tanto de todas as músicas, que não conseguia escolher uma.

Eu gravei em 1974 e fui conhecer Manacéia depois. Eu ainda morava em São Paulo. Em 1975 fui apresentada ao Monarco. Ele combinou com Manacéia e Dona Neném de fazer um peixe e me convidou. Foi aí que conheci todos. Alvaiade ainda era vivo. Foi uma tarde maravilhosa. Eles cantaram muito samba e eu levei um gravadorzinho e comecei a gravar.

LCM: Essa é a origem do seu baú?

CB: Sim. Eu já tinha alguma coisa gravada na casa do Candeia. Comecei a frequentar sua casa por volta de 1969, 1970. Ele já morava em Jacarepaguá. Quando eu vinha de São Paulo, costumava frequentar um lugar chamado Orfeão Portugal, onde Candeia se apresentava às vezes. Lembro que ele chegava numa limusine e o motorista o tirava na cadeira de rodas. A limusine era do Natal.

LCM: Limusine mesmo? Aquela grande?

CB: Sim. Enorme. Toda vez que Candeia ia cantar em algum lugar, Natal mandava seu motorista levá-lo.

Então, na Portela eu tinha uma ligação maior com Candeia até conhecer a Velha Guarda.

LCM: Antes de você conhecer a Velha Guarda, do que você gostava? De rock?

CB: Não. De rock nunca gostei, não. Sempre gostei mesmo de samba. Ouvia os discos dos meus irmãos mais velhos. Araci de Almeida, Ciro Monteiro, Mário Reis, Carmem Miranda, era o que eu curtia mais. O choro só fui conhecer depois. Gostava de sambas mais antigos mesmo.

PW: Antes do LP “Cristina”, em que gravou “Quantas Lágrimas”, você teve participação em outros discos?

CB: Sim. Minha primeira participação foi quando eu tinha 16 anos, num disco de Paulo Vanzolini, que era muito amigo dos meus pais. Minha mãe era contra essa história de cantar, mas ele conseguiu convencê-la. Na verdade, era um disco promocional para dar de presente. Não era para ser comercializado.

Depois o Chico me chamou para gravar “Sem fantasia”. Participei também de um disco do Chico Maranhão. Foram várias participações até gravar um disco meu.

 

 

LCM: O sucesso de “Quantas Lágrimas” foi imediato?

CB: Foi uma coisa engraçada. Foi tocando, tocando e virou sucesso. Teve várias pessoas, inclusive presos políticos, que me diziam que quando ouviram a música começaram a chorar. Acabou quase virando uma coisa política e não tinha nada a ver. É uma música de amor. Uma época em que as pessoas estavam muito infelizes com o passado e acabou pegando por aí também. Mas era um sucesso de tocar nas rádios, porque eu não fazia shows.

LCM: Foi do seu primeiro disco?

CB: Sim. Do “Cristina”, de 1974. Dois anos depois eu gravei o “Prato e Faca”, que foi um fracasso completo. Não tocou, não vendeu.

LCM: Só por isso. Não se pode dizer que o disco é um fracasso.

CB: Vendeu muito pouco.

PW: No “Cristina” tinha “Quantas Lágrimas”. No “Prato e Faca” tinha músicas de outros compositores portelenses, além de Manacéia?

CB: O “Prato e Faca” foi depois de eu ter ido à casa do Manacéia. Já tem outros sambas dele e de outros compositores.

LCM: Eu sei que você vai ter dificuldade em responder essa pergunta. Claro que foi Paulinho da Viola que teve o grande papel de gravar o primeiro disco da Velha Guarda, mas seu trabalho de ir lá gravar, de colocar vários sambas nos seus discos, faz de você uma pioneira para muitos de nós. Você tem consciência desse papel que você teve nisso?

CB: Não vejo assim, não. Eu sempre gravei o que gosto. E gosto de mostrar as músicas. Não gosto de gravar músicas conhecidas. Até mesmo nas rodas de samba, eu gosto de ver as pessoas ouvindo pela primeira vez. Mas não tive a intenção de ser pioneira.

Eu gravei muito menos do que gostaria de ter gravado. O ideal era fazer um disco a cada dois anos. Em quantidade eu gravei muito pouca coisa. Por exemplo, a Clara gravou muita coisa, e só não gravou mais porque morreu. A Beth Carvalho também gravou muita coisa da Portela.

Acho que o cantor tem que reverenciar o compositor. Gravar o samba mais próximo, mais fiel ao que o compositor fez. E não achar que o compositor tem que agradecer ao cantor pelo sucesso.

Tem uma coisa muito bonita, numa entrevista do Ciro Monteiro, em que ele fala mais ou menos assim: “Eu tive a honra de gravar o primeiro sucesso do Geraldo Pereira e tive a felicidade de ele me dar o último sucesso antes de morrer”. Ou seja, a elegância com que ele fala, a admiração pelo Geraldo Pereira.

LCM: Quando ele fala isso, está considerando mais nobre o ato de compor do que o de cantar.

LCM: Tem muita coisa ainda para gravar?

CB: Eu gravei menos discos do que gostaria de ter gravado. Gravei em 1974, 1976, 1978 e 1981. Depois só em 1985. Gravei em 90, mas só saiu no Brasil em 1994. Aí comecei a fazer um monte de coisa. Dois discos sobre Noel Rosa. Em 2000, um sobre Wilson Batista. Fiz o primeiro trabalho com o Terreiro Grande. Ao mesmo tempo o disco com a Banda Glória de São Paulo e o disco em homenagem ao Mauro Duarte. Esses três embolaram. Agora, por último, o Candeia com Terreiro Grande.

LCM: Cristina, conta pra gente como foi a história do selo Panha Mufada.

CB: Isso foi uma brincadeira do Rodrigo, que produziu a capa do disco “Ganha-se pouco”. Ele é um cara muito divertido, gosta de cantar, de representar e trabalha muito bem com computador. Num disco do Chico tinha um samba muito bom do José Ramos (José Ramos da Mangueira, autor de Jequitibá do Samba). E aí combinamos de ir à casa do Zé para ouvir as coisas dele. Foi uma certa decepção, porque ele não tinha muita coisa. Tinha ao todo uns 11 ou 12 sambas. Ele dizia que passou a vida trabalhando para sustentar a família e que não era muito de frequentar samba, ficar na noite. A parte de sambista ficava em segundo plano. E ali nós ficamos conversando. A mulher do Zé Ramos tinha algum tipo de doença que a gente não sabia bem o que era. Ela ficava o tempo todo sentada completamente parada, como uma estátua. E tudo que ele falava, perguntava para ela: “Não é?” E ela parada, não respondia, nem mexia a cabeça.

No começo a gente achou meio estranho, mas com a conversa nos acostumamos com aquela estátua ali. Estava junto o pesquisador Paulo César Andrade. Num determinado momento ele levantou e uma almofada caiu no chão. De repente aquela voz de trovão no meio da sala: “Panha mufada”. Foi aquele susto (rs). Era a mulher do Zé Ramos. E isso acabou virando nosso grito de guerra, toda vez que a gente se encontrava.

A história do selo foi uma brincadeira com isso. Pirataria pura. Como ele mexe com computador, fez aquele pirata padrão e colocou o nome do selo de “Panha Mufada”. E ainda colocou com fundadora Dona Nilcéia Ramos (rs).

 

 

LCM: Voltando à pergunta anterior, ainda tem muita coisa no seu baú?

CB: Eu já dei muita coisa. Algumas se perderam. Mas como as pessoas sabem que eu gosto, me dão muita coisa também. Monarco foi fazer um show em Minas e o pessoal de lá gravou horas com ele e mandou para mim. Monarco tem dia que lembra alguns sambas, tem dias que lembra outros. Ela sabe muita coisa, mas às vezes não lembra de quem é.

Mas eu já passei esse material para muita gente. Quando a Marisa Monte fez “Tudo Azul”, eu dei tudo que tinha e ela aproveitou alguma coisa. Não adianta eu ficar com isso guardado. Quando as pessoas gravam, vão passando.

LCM: Nós gostaríamos de saber de sua relação com a Portela da Sapucaí. Você assiste ao desfile? Você torce?

CB: Dependendo da hora, eu até vejo. Mas eu não gosto muito não, em função dos sambas de hoje, do andamento. Não me agrada muito. Que eu me lembre, o último desfile que me emocionou foi Kizomba, da Vila Isabel. Eu nem conhecia o samba da Vila e gostava muito do samba da Mangueira. Mas quando eu acordei e vi o desfile, eu chorava e acordava meus filhos para ver.

Desfilei na Portela em 1984. Depois desfilei na ala da Surica, mas aquelas fantasias de ala me incomodavam muito. Desfilei na Mangueira em homenagem ao Chico. Mas para desfilar na Mangueira, tinha que desfilar também na Portela. Então nesse mesmo ano, desfilei em um carro com vários artistas. Depois desfilei algumas vezes no carro com a Velha Guarda e resolvi parar. Eu não sei sambar, mas para desfilar você tem pelo menos que saber o samba, não dá para desfilar muda. Mas com esses sambas não dá vontade.

Uma vez eu acompanhei a disputa do samba. Tinha um samba do Bolacha (Mauro Duarte) com Wilson Moreira e Walter Alfaiate. Aí o Paulão 7 Cordas falou que o samba era muito bonito, mas não ia ganhar. Quando cantaram o samba, a primeira coisa que perguntaram foi: “Cadê o refrão? Onde nós vamos fazer a paradinha?” O samba caiu quando ainda havia uns 16 na disputa.

Agora, eu gosto de acompanhar a apuração. Às vezes eu nem vejo o desfile, mas fico ali acompanhando a apuração.

LCM: Ainda sobre as escolas de samba, você se interessa por esses novos rumos do desfile, pelo espetáculo? Você sente alguma coisa?

CB: Nada. Hoje o mais importante é o espetáculo. É muito dinheiro que rola. O carnaval virou outra coisa e eu não me interesso por essa coisa. Não podemos negar que é um espetáculo, mas não é mais escola de samba. Pode ser espetacular, pode ser lindo, mas eu não me interesso por isso, não.

LCM: Desses compositores todos, dos que não estão mais vivos, qual você acha o melhor? Quem considera fantástico?

CB: É difícil. São muitos. Eu não conheço profundamente tudo o que eles fizeram. Mas Manacéia com certeza. O Mijinha é um cara que eu conheço pouca coisa, mas é sensacional. Chico Santana, Alvaiade, Alvarenga. Aniceto eu conheço pouca coisa, mas muito boas. Monarco e Alcides. Naquele tempo quando um fazia uma música boa, o outro tinha que fazer também.

Agora, eu tenho um carinho todo especial pelo Cartola. Ele é maravilhoso. Muito louco.

PW: Cristina, você falou que o povo, sabendo dessa sua característica de pesquisadora de samba, tem te dado muita coisa. Você destacaria algum compositor que esteja começando, que você goste muito?

CB: O que eu gosto mesmo é da maneira como o povo da antiga fazia samba, que hoje ninguém sabe fazer. Tem muita gente boa, mas fazendo outro tipo de samba…

PW: Diferente como?

CB: Melodia, letra também. Tem coisas boas, mas eu que não gosto muito.

PW: Você tem feito trabalhos muito interessantes, como os projetos com o Terreiro Grande e o Samba de Fato. Como surgiram esses projetos e como conheceu os grupos?

CB: São coisas diferentes. Eu fui fazer um show em São Paulo com Paulão 7 Cordas sobre a Portela. Um dos rapazes do Terreiro Grande é amigo do Paulão e foi ao camarim. Na conversa ele falou do grupo, que tocava basicamente sambas de terreiro de compositores do Rio de Janeiro e que gostaria de me convidar para assisti-los. Deixei meu telefone para contato. Depois disso ele me ligou algumas vezes convidando. Eu já não estava mais frequentando as rodas de samba no Rio e ficava imaginando ir para São Paulo ouvir os mesmos sambas. Mas na terceira vez que ele me chamou, não teve jeito, decidi ir, porque já estava ficando chato. Eles iam fazer uma homenagem ao Alvaiade. Eu peguei tudo que eu tinha do Alvaiade nas fitas e mandei para eles, além dos muitos sambas dele já gravados. Fui e fiquei impressionada. Eles marcaram uma peixada num dia e no dia seguinte o show. Eu me senti na Portela de antigamente. Eram uns 30 no grupo e cantavam sambas desconhecidos ou pouco conhecidos, que eles recuperaram num trabalho de pesquisa. Foi fantástico. Me deram sambas que eu não conhecia, inclusive do Manacéia.

LCM: Você identifica esse interesse deles no samba do Rio em geral ou mais na Portela?

CB: Mais Portela. Eles têm material do Império Serrano, da Mangueira, Estácio, mas a pesquisa maior é Portela. A história do Terreiro Grande é mais ou menos essa. Depois fizemos um show em São Paulo que virou disco.

O projeto com o Samba de Fato começou quando eu passei para o Paulinho Pinheiro partes de músicas do Bolacha que eu tinha e perguntei se ele não gostaria de fazer alguma coisa. Passaram anos e um dia ele me ligou dizendo que estava com um disco inteiro de músicas do Bolacha. Com 13 músicas. O Alfredo Del Penho estava fazendo, junto com Paulo César de Andrade, uma pesquisa grande das músicas do Mauro. Esse trabalho acabou reunindo muita coisa do Bolacha. O Alfredo procurou várias gravadoras e conseguiu a Deskdisc e o Samba de Fato era um grupo que eles já tinham. E aí eles perguntaram o que eu achava de gravar o disco só com o Samba de Fato. Eu achei ótimo. E com isso ele conseguiu fazer o CD duplo, misturando as inéditas com outras músicas do Bolacha. O disco ficou lindo. Os arranjos são lindos.

A história desses trabalhos é mais ou menos essa.

LCM: Você falou anteriormente da parceria de samba-enredo do Mauro Duarte, Walter Alfaiate e Wilson Moreira. Uma coisa que eu venho pensando ultimamente é sobre a relação do bairro Botafogo com a Portela. Você conviveu com esse universo do samba em Botafogo?

CB: Muito pouco. Nessa fase boa de Botafogo, ou eu era criança ou morava em São Paulo. Mesmo quando eu vinha ao Rio, não cheguei a frequentar não. Não conheci o cantinho da fofoca. O que eu conhecia de Botafogo era o que o Bolacha falava. Ele cantava sambas maravilhosos de compositores do bairro. Quem sabe muita coisa é o Paulinho da Viola.

LCM: É nisso que eu tenho pensado. Botafogo tem uma história tão bonita no samba e quase não se fala. E no momento, algum projeto novo? Alguma coisa saindo?

CB: No momento não.

PW/LCM: Cristina, gostaríamos de agradecer pela recepção aqui na sua casa, pela entrevista e por esse encontro delicioso.

CB: Eu é que agradeço o carinho.

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